Wiki: Língua africâner (1/2)
Africâner, africânder ou afrikaans é uma língua do ramo germânico do grupoindo-europeu falada na África do Sul e na Namíbia.
Índice:
Africâner (Afrikaans) | |
Falado em: | |
Total de falantes: | 16.000.000 |
2a posição como língua nativa e 17a posição contando também os que a falam como 2a língua. | |
Estatuto oficial | |
Língua oficial de: | |
Códigos de língua | |
ISO 639-1: | af |
ISO 639-2: | afr |
ISO 639-3: | |
SIL: | AFR |
1. História
O africâner foi originalmente o dialeto surgido na região do Cabo da Boa Esperança na África do Sul como resultado da interação entre os colonoscalvinistas europeus chamados africânderes e a força de trabalho não-européia trazida à região pela Companhia Holandesa das Índias Orientais.
A maioria dos colonos europeus que se estabeleceram no Cabo nos séculos XVII e XVIII provinha dos Países Baixos, mas muitos também eram alemães, com um número considerável ainda de franceses e uns poucos escoceses. A Companhia das Índias Orientais trouxe também para a região vários trabalhadores malaios,indonésios e malgaxes, além de indígenas locais dos povos khoi e san. Uma pesquisa feita por J. A. Heese indica que até 1807, 36,8% dos ancestrais dos falantes de africâner eram de origem neerlandesa, 35% alemã, 14,6% francesa e 7,2% de origem não-européia. O vernáculo da colônia tornou-se conhecido na Europa como holandês do Cabo. Posteriormente, foi chamado também holandês africano. O africâner era considerado um dialeto do neerlandês até o início doséculo XX, quando começou então a ser reconhecido como uma língua distinta.
O vocabulário do holandês do Cabo divergiu daquele falado nos Países Baixos após absorver palavras usadas pelos colonizadores europeus não-neerlandeses, escravos trazidos do sudeste da Ásia e africanos nativos. Em meados do século XIX, ampliou-se o uso vernacular do africâner quando milhares de pioneiros africânderes, fugindo do domínio britânico da Colônia do Cabo, migraram para as regiões central e norte-oriental da África do Sul onde, após conflitos com os zulus, estabeleceram as repúblicas bôeres independentes de Orange e Transvaal.
No material impresso entre os africânderes, originalmente se utilizou somente o neerlandês padrão europeu, enquanto o africâner propriamente dito era relegado à condição de língua oral apenas. As primeiras gramáticas e dicionários em africâner foram publicados em 1875 na Cidade do Cabo pela Genootskap vir Regte Afrikaanders (Sociedade dos reais africânderes), com o objetivo de fixar um padrão escrito para a língua. Em 1910, as antigas repúblicas bôeres, agora também sob domínio britânico, foram oficialmente incorporadas à União Sul-Africana (junto com as colônias do Natal e do Cabo) e reconheceram-se o inglês e o neerlandês como línguas oficiais do novo país. Em 1925 porém, o governo autônomo sul-africano proclamou o africâner uma língua distinta e elevou-o à condição de idioma oficial substituindo na prática o neerlandês.
Pela sua origem histórica, o africâner é lingüisticamente semelhante ao neerlandês do século XVII e, por extensão, ao neerlandês moderno. Outras línguas semelhantes incluem o baixo saxão falado no norte da Alemanha e nos Países Baixos, o próprio alemão padrão e o inglês. Além do vocabulário, a mais sensível diferença entre o africâner e o neerlandês europeu é a sua gramática muito mais regular, que, na opinião da maioria dos lingüistas, é resultado da interferência mútua durante o período de formação do idioma com uma ou mais línguas crioulasfaladas por um número relativamente grande de habitantes da Colônia do Cabo cuja língua materna era diferente do neerlandês (khoisan, alemão, francês, malaio, ou diferentes línguas africanas). A chamada "escola africânder" mantém entretanto o ponto de vista alternativo de que a regularização da gramática africâner foi uma evolução natural dos dialetos sul-neerlandeses, minimizando assim o papel exercido pelo contato com outras línguas.
2. Ortografia e Vocabulário
Em termos de vocabulário, o africâner é muito próximo ao neerlandês sendo usualmente mutuamente inteligível com este, ao menos na sua variedade escrita (a inteligibilidade é geralmente menor na língua falada). Como esperado, há ainda um grau considerável de sobreposição entre o léxico básico do africâner e de outraslínguas germânicas ocidentais, especialmente o alemão e, em menor escala, oinglês. Contudo, apesar de suas semelhanças e origem comum, o alemão e o inglês não são em geral mutuamente inteligíveis entre si e os falantes de cada uma dessas línguas normalmente precisam ter algum conhecimento prévio formal do vocabulário, gramática e fonética das demais para poder compreender até mesmo sentenças simples.
O africâner, juntamente com o neerlandês e o inglês, diferencia-se do alemão pela ausência da segunda mutação de consoantes germânica: compare, por exemplo, afr. maak, neerl. maken, ing. make com alem. machen, ou afr./neerl. dood e Ing.dead com Alem. tot, ou Afr. oop, Neerl./Ingl. open e Alem. offen. O africâner diferencia-se ainda, não só do neerlandês como de outras línguas germânicas, por alguns fenômenos evolutivos peculiares como, por exemplo, a perda de certas consoantes em posição final ou em posição intervocálica.
Comparado com o neerlandês, o africâner adota uma ortografia simplificada e mais fonética. Consoantes mudas em neerlandês como -n final não são escritas em africâner. O ditongo neerlandês /ɑi/ grafado "ij" é escrito "y" em africâner com o mesmo valor fonético. Outra característica do africâner é a inexistência da consoante fricativa alveolar sonora /z/ (grafada "z" em neerlandês) que é substituida pela sua variante surda /s/, grafada "s" (por exemplo, afr. Suid-Afrikavs Neerl. Zuid-Afrika). O grupo consonantal neerlandês "sch" corresponde por sua vez ao africâner "sk".
A tabela abaixo ilustra algumas diferenças e semelhanças entre o africâner, o neerlandês, o alemão e o inglês. Palavras em inglês de origem latina/românica são indicadas por um asterisco.
Africâner | Neerlandês | Alemão | Inglês | Português |
aksie | actie | Aktion | action | ação |
appel | appel | Apfel | apple | maçã |
asseblief | alstublieft | bitte ("als es dir beliebt") | please (*) | por favor |
bed | bed | Bett | bed | cama/leito |
beter | beter | besser | better | melhor |
dood | dood | tot | dead | morto |
dorp | dorp | dorf | village (*) | vila/aldeia |
droog | droog | trocken | dry | seco |
eggenoot | echtgenoot | Ehegatte | husband | marido |
gee | geven | geben | give | dar |
goeienaand | goedenavond | Guten Abend | good evening | boa noite |
help | helpen | helfen | help | ajudar |
koop | kopen | kaufen | buy | comprar |
leer | leren | lernen | learn | aprender |
lê | liggen | liegen | lie | ficar |
lughawe | luchthaven | Flughafen | airport(*) | aeroporto |
maak | maken | machen | make | fazer |
my | mijn | mein | my | meu |
nie | niet | nicht | not | não |
oop | open | offen | open | aberto |
oormôre | overmorgen | übermorgen | the day after tomorrow | depois de amanhã |
opstaan | opstaan | aufstehen | stand up | levantar-se |
reën | regen | Regen | rain | chuva |
saam | samen | zusammen | together (cf. same) | juntamente |
ses | zes | sechs | six | seis |
sewe | zeven | sieben | seven | sete |
skool | school | Schule | school | escola |
slaap | slapen | schlafen | sleep | dormir |
sleg | slecht | schlecht | bad (cf. slight) | mau |
tyd | tijd | Zeit | time (cf. tide) | tempo |
uitbrei | (zich) uitbreiden | (sich) ausbreiten | expand (*) | expandir(-se) |
vir | voor | für | for | para |
voël | vogel | Vogel | fowl (bird) | pássaro |
vry | vrij | frei | free | livre |
vyf | vijf | fünf | five | cinco |
waarskynlik | waarschijnlijk | wahrscheinlich | probably(*) | provavelmente |
winter | winter | Winter | winter | inverno |
ys | ijs | Eis | ice | gelo |
Apesar de a maioria do vocabulário africâner refletir sua origem do sul-neerlandês do século XVII, ele também contém palavras emprestadas de línguas indonésias,malaio, português, francês, os dialetos khoi e san, inglês, isiXhosa e muitas outras. Conseqüentemente, algumas palavras em africâner são muito diferentes do neerlandês, como demonstrado pelos nomes de diferentes frutas:
Português | Inglês | Neerlandês | Alemão | Malaio | Africâner |
laranja | orange | sinaasappel | Apfelsine | oren/limau | lemoen |
limão | lemon | citroen | Zitrone | limau | suurlemoen |
banana | banana | banaan | Banane | pisang | piesang |
2. 1. Vocabulário de origem portuguesa
- moveer derivado de mover
- novas derivado de novas
- maai/paai derivado de mãe/pai
- bredie derivado de bredo
- kombers derivado de cobertas
- kraal derivado de curral
3. Fonética
4. Gramática
Gramaticalmente, o africâner caracteriza-se por ser o idioma mais analítico entre as línguas indo-européias. Comparado com o neerlandês padrão, destaca-se pela sua simplicidade morfológica: os verbos não se conjugam em número, pessoa e modo; os substantivos não têm gênero; não há distinção morfológica de casos gramaticais (exceto alguns resquícios no sistema pronominal); e os diferentes tempos verbais são indicados primordialmente por construções perifrásticas ao invés de flexões dos verbos. Quase a totalidade dos verbos africâneres são ainda regulares. Sintaticamente, porém, o africâner apresenta características semelhantes a outras línguas germânicas ocidentais com algumas complicações adicionais como a dupla negação, que é peculiar ao africâner e tem origem ainda não esclarecida. Influências do francês e do san, assim como de dialetos baixos-francônios da Flandres ocidental e de vilas isoladas no centro da província da Holanda (Garderen) foram sugeridas como possíveis origens da dupla negação africâner, mas nenhuma dessas sugestões até hoje se mostrou plenamente satisfatória.
4. 1. Pronomes
O africâner distingue pronomes pessoais por número (singular ou plural), pessoa ( primeira, segunda e terceira) e, ocasionalmente, caso (pronomes usados como sujeito e pronomes usados como objeto direto/indireto). Na terceira pessoal do singular existe ainda uma distinção por gênero entre pronomes masculinos, femininos e neutros (como em inglês, neerlandês e alemão). Na segunda pessoa do singular, como em inúmeras outras línguas indo-européias, há também umadistinção T-V entre tratamento formal e informal. Em geral, não se distinguem pronomes pessoais de objeto direto/indireto de pronomes adjetivos possessivos, exceto na terceira pessoa do singular e, ocasionalmente, na segunda e terceira pessoas do plural.
Pessoa/número | Pronomes pessoais de sujeito | Pronomes pessoais de objeto | Pronomes adjetivos possessivos | Pronomes substantivos possessivos |
Primeira pessoa do singular | Ek | my | my | myne |
Segunda pessoa do singular | Jy (informal), u(formal) | jou (informal), u(formal) | jou (informal), u(formal) | joune (informal), u s'n (formal) |
Terceira pessoa do singular | Hy (masc.), Sy(fem.), Dit (neut.) | hom (masc.), haar(fem.), dit (neut.) | sy (masc.), haar(fem), dit (neut.) | syne (masc.), hare(fem.) |
Primeira pessoa do plural | Ons | ons | ons | ons s'n |
Segunda pessoa do plural | Julle | julle | julle/jul¹ | julle s'n |
Terceira pessoa do plural | Hulle | hulle | hulle/hul¹ | hulle s'n |
¹ As variantes hul e jul são freqüentemente utilizadas distinguir o pronome possessivo dos correspondente pronome pessoal de sujeito/objeto.
4. 2. Adjetivos
Os adjetivos em africâner não são flexionados em gênero e número. Existe entretanto uma diferenciação morfológica entre adjetivos predicativos (que se seguem ao substantivo a que se referem) e atributivos (que precedem o substantivo que modificam). Como em alemão e neerlandês, os adjetivos predicativos em africâner nunca são flexionados. Aos adjetivos atributivos polissilábicos, adiciona-se normalmente o sufixo -e. Os adjetivos atributivos monossilábicos por outro lado podem ou não ser flexionados e, quando flexionados, podem sofrer outras alterações morfológicas de acordo com um conjunto complexo de regras fonológicas. A tabela abaixo ilustra a morfologia do adjetivo africâner.
Predicativo | Atributivo | Inglês | Português |
hoog | hoë | high | alto, alta, altos, altas |
laag | lae | low | baixo, baixa, baixos, baixas |
leeg | leë | empty | vazio, vazia, vazios, vazias |
sleg | slegte | bad | mau, má, maus, más |
reg | regte | right | certo, certa, certos, certas |
koud | koue | cold | frio, fria, frios, frias |
goed | goeie | good | bom, boa, bons, boas |
jonk | jong | young | jovem, jovens |
doof | dowe | deaf | surdo, surda, surdos, surdas |
oud | ou | old | velho, velha, velhos, velhas |
nuut | nuwe | new | novo, nova, novos, novas |
groot | groot | big/great | grande, grandes |
swart | swart | black | preto, preta, pretos, pretas |
draagbar | draagbare | portable | portátil, portáteis |
Como nas outras línguas germânicas, o adjetivo africâner é também flexionado em grau, indicando comparativo e superlativo. Nesse caso, as mesmas regras fonológicas ilustradas na tabela acima se aplicam, e.g., koud - kouer (compar.) -koudste (superl.); reg - regter (compar.) - regste (superl.); goed - beter(compar.) - beste (superl.); nuut - nuwer (compar.) - nuuste (superl.).
4. 3. Substantivos
Ao contrário do neerlandês e do alemão, o africâner não distingue substantivos por gênero. Há porém uma distinção de número (singular ou plural). Na maioria dos casos, o plural dos substantivos africanos é formado adicionando-se o sufixo -e à sua forma singular. Há entretanto uma classe grande de substantivos que formam o seu plural alternativamente com a adição do sufixo -s como em inglês. Vários substantivos apresentam também plurais irregulares ou, quando flexionados em número, sofrem as mesmas alterações morfológicas que se verificam na flexão dos adjetivos. A tabela abaixo ilustra algumas classes comuns de plurais de substantivos africâneres.
Singular | Plural | Inglês | Português |
voet | voete | foot/feet | pé(s) |
vraag | vrae | question(s) | pergunta(s) |
leef | lewe | life/lives | vida(s) |
oog | oë | eye(s) | olho(s) |
minuut | minute | minute(s) (*) | minuto(s) |
tyd | tye | time(s) | tempo(s) |
nag | nagte | night(s) | noite(s) |
stad | stede | city/cities (*) | cidade(s) |
ei | eier | egg(s) | ovo(s) |
lied | liedere | song(s) | canção/canções |
kind | kinders | child/children | criança(s) |
tafel | tafels | table(s) (*) | mesa(s) (cf. tábua(s) ) |
voël | voëls | fowl(s) (or bird(s)) | pássaro(s), ave(s) |
Além de não apresentarem gênero, os substantivos africâneres tampouco são flexionados por caso. Construções perifrásticas são usadas como no neerlandês coloquial para designar o caso genitivo, por exemplo Oom Gert se winkel (Port. "a loja do tio Gert", Inglês Uncle Gert's shop/store ). Outras distinções de caso são indicadas sintaticamente através da ordem das palavras na oração ou pelo uso de preposições, por exemplo van ("de"), vir ("para"), e deur (equivalente ao Port. "por" usado para marcar o agente da passiva, cf. Neerl. door, Al. durch).
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